ARK: Survival Evolved é um jogo de sobrevivência desenvolvido pelo Studio Wildcard, lançado oficialmente para a PlayStation 4, Xbox One, Microsoft Windows, OS X e Linux, em agosto de 2017. Já este ano, a 14 de junho, foram lançadas versões gratuitas para Android e iOS, parecendo então que ARK está disponível em quase todas as plataformas. Faltaria apenas a Nintendo Switch, algo que mudou, precisamente, no passado dia 30 de novembro, o dia do seu lançamento oficial nesta popular plataforma.
Muitos leitores certamente já saberão da existência de ARK muito antes da sua data de lançamento oficial em 2017, uma vez que o jogo existe em acesso antecipado desde junho de 2015, tendo desde então recebido várias expansões sob a forma de DLC pago. Na altura, o lançamento destas mesmas expansões causou alguma polémica junto da comunidade, por estarmos a falar de um jogo de acesso antecipado, ou seja, ainda por terminar, com a presença de erros, bugs e falta de otimização. Lançar pacotes de expansão num jogo que se apresentava numa condição muito vulnerável, para maximizar as vendas por parte de uma comunidade de jogadores entusiasta sem antes resolver os problemas de base do jogo, foi algo que levantou algumas criticas.
A versão lançada para a Switch parece manter os mesmos problemas, particularmente sérios a nível gráfico, e, a um preço de cerca de 50 euros, apenas inclui o mapa original, The Island. Nesta análise de ARK: Survival Evolved para a Nintendo Switch começarei por avaliar a performance técnica e grafismo do jogo antes de passar a quaisquer outros pontos. Normalmente noutra situação não consideraria dar tanta preponderância a algo como os gráficos, em comparação com a tão importante jogabilidade, mas, neste caso específico, afetam o jogo de uma maneira demasiado fundamental para poder ignorar ou passar ao lado.
UMA HISTÓRIA PRIMITIVA
A história ou, melhor dizendo, a premissa de ARK é bastante simples, possivelmente demasiado simples. O jogo não tem cenas cinematográficas elaboradas que contem a história misteriosa da ilha ARK e o porquê de ser habitada por criaturas pré-históricas. A construção de mundo em ARK é muito interessante, e cenários pré-históricos com dinossauros, mesmo ainda hoje, após algo como Horizon Zero Dawn, parecem subaproveitados dado o seu enorme potencial. Sinto que em ARK é o potencial narrativo que está subaproveitado. Parecem ter criado um mundo superinteressante, mas não fizeram nada com ele, narrativamente falando.
Após criarmos o nosso personagem, somos diretamente colocados na ilha, prontos (ou não) para sobreviver e criar a nossa própria aventura. Em ARK, a aventura e histórias são nossas, são deixadas ao encargo do jogador. Se para alguns isso não será motivação suficiente para prosseguir com o jogo, para outros a sensação de liberdade e o sentido de exploração e descoberta certamente valerão a pena.
GRÁFICOS E PERFORMANCE
Não vou ser um Dodó mansinho, uma das criaturas que podemos encontrar no jogo. Vou ser um autêntico T-Rex ao dizer que ARK: Survival Evolved é graficamente um dos piores jogos que alguma vez joguei na Switch. O estado em que este jogo foi lançado nada tem a ver com a “falta de potência” da consola. A Switch é, até à data, a consola portátil mais potente alguma vez criada. Nela, já assistimos ao lançamento de verdadeiras obras de arte em termos gráficos, que destroem completamente a teoria de que uma consola necessita de uma maior potência para ter melhores gráficos (uma filosofia, enfim, absolutamente inversa à da própria Nintendo). Se tal afirmação se revela verdade no que toca a empurrar cada vez mais pixéis para um ecrã, por vezes um bom estilo de arte pode chegar muito longe no que toca a dar um grafismo impressionante a um jogo, e disso não faltam exemplos na Switch, sejam os jogos exclusivos da Nintendo ou não. Até mesmo jogos AAA desta geração já foram adaptados para a Switch, com resultados positivos. Rocket League, Doom, Wolfenstein II: The New Colossus e Warframe foram todos trazidos para a consola através da magia da Panic Button, o que prova ser possível fazer pequenos “milagres” com este pedacinho de hardware. A nível pessoal fiquei também bastante impressionado ao ver Paladins a correr na Switch a 60 FPS com aquele nível de fidelidade gráfica.
Tudo isto para afirmar que não é por falta de potência por parte da consola que ARK: Survival Evolved parece uma pintura rupestre. ARK já era um jogo infamemente conhecido pela sua pobre otimização, qualquer que fosse a plataforma. Neste sentido, parece um bocado contrassenso terem tido a ideia de o trazer para a Switch. Por um lado, percebo a decisão. A Switch é atualmente uma plataforma muito popular, e com isso desejável, vende bastante bem, seria um potencial novo mercado que possivelmente nunca jogou ARK, ou seja, um mercado ao qual vender as expansões. Contudo, só porque podiam fazer um port do jogo, não quer dizer que devessem, se para tal têm de ser feitos tantos sacrifícios gráficos que diminuem significativamente a experiência e a tornam tão mais pobre.
Quando pela primeira vez iniciei o jogo e vi os gráficos, fiquei completamente estacado a olhar para o meu monitor, perguntando-me se o que se deparava diante de mim era realmente um jogo para a Switch, um jogo para a PS2, para a PS1, ou uma pintura em aguarela amadora, porque, juro, parecia tudo borratado, especialmente quando no modo portátil. Não possuo os aparatos técnicos necessários para indicar com maior precisão aquilo de que falo, mas a resolução é baixíssima, arriscando-me a dizer que será equivalente a 480p em modo TV, e 360p ou menos em modo portátil. Relembro que o ecrã da Switch é HD, possuindo uma resolução de 720p. No geral, em ambos os modos, a qualidade de imagem é péssima.
Quando disse a piada da aguarela estava meio a brincar, meio a falar a sério. Há capturas de ecrã tiradas no modo portátil que passariam perfeitamente por pinturas de feira artisticamente pobres. As cores e as formas apresentam-se todas borratadas, e este efeito “artístico” é particularmente observável no que toca à vegetação. As texturas têm péssima qualidade, caraterística que se estende também às rochas e ao solo, que parece ter sido retirado de um jogo arcade do século passado.
Durante as minhas sessões de jogo encontrei alguns bugs. Não arruinaram a minha experiência de jogo, na verdade até foram engraçados. Houve um em que encontrei um dinossauro que estava preso a uma árvore porque a árvore o estava a atravessar ao meio enquanto ele “caminhava”.
Resta dizer que foi um almoço muito fácil de apanhar, e apesar de ter sido um momento bem divertido, que me fez rir, bugs como este não passam a imagem de este ser um jogo polido que justifique os cerca de 50 euros pedidos.
As animações do personagem são um bocado grotescas e metem alguma impressão, especialmente num jogo que procura ser “realista”. Quando procuramos por bagas nas ervas, a animação que o personagem faz parece indicar que ele está simplesmente a escarafunchar no ar junto da planta. Quando cortamos uma árvore, ela não cai realmente, simplesmente desaparece antes de bater no chão, sem produzir qualquer som. É uma execução que se sente um bocado áspera, prejudicando até o meu sentido de imersão.
Para além de tudo isto, o jogo sofre de um imenso efeito pop-in, em que à medida que caminho pelo mapa começam subitamente a aparecer texturas e objetos que previamente não estavam lá por ainda não terem carregado. A distância de renderização é mesmo muito baixa, o que torna este efeito demasiado pronunciado. Nunca antes num jogo, aliás, tinha visto pop-in a acontecer assim tão de perto. Falo de folhagem de árvores constantemente a carregar a alguns metros de onde está o nosso personagem, ou a sombra de uma árvore grande só carregar quando estou mesmo por baixo dela.
Está sempre a acontecer, mas, de facto, penso ser algo propositado, tendo o objetivo de intercalar e espaçar o esforço que a Switch está a ter em processar o mundo aberto, para não esforçar o processador e a placa gráfica, e não prejudicar em demasia os frames por segundo, que, mesmo assim, continuam a atravessar algumas dificuldades. Percebo o que tentaram fazer aqui e certamente foi no bom sentido, mas o efeito simplesmente não passa despercebido, é marcadamente evidente.
Em relação aos frames por segundo, fiquei surpreendido pela positiva, no sentido de que este jogo é… jogável. O framerate aguenta-se bem. É capaz de, quando começo a correr, diminuir um bocado, e também é verdade que não cheguei a atravessar zonas habitadas por muitos mais dinossauros, mas do que joguei quase nunca experienciei quedas assim tão abruptas nos frames. O jogo tem uma fidelidade gráfica muito pobre, como já referi, e isso pelo menos compensa nalgum lado.
O tempo de carregamento no modo para um jogador é algo que me deixou impressionado, chegando a demorar quase três minutos para carregar o mapa. Já no modo multijogador não se verifica quase nenhum tempo de carregamento, sendo praticamente imediato, demorando apenas alguns segundos.
JOGABILIDADE NA SWITCH
Estamos em 2018, e a febre dos jogos de sobrevivência de outrora parece ter enfraquecido, ou, pelo menos, sido substituída pela evolução de uma das suas componentes, que atualmente se dá pelo nome de Battle Royale, e que parece ser a nova tendência.
Como referi, a premissa em ARK é simples. A forma como a premissa em ARK se desenrola é que não é nada simples. O jogo é complexo, e tem presentes inúmeros sistemas diferentes. Como jogo de sobrevivência que é, temos de gerir a fome, a sede, a energia, mas também a saúde, a temperatura e o peso. Se tivermos muita sede, desmaiamos. Se comermos muito, engordamos. Se estivermos muito carregados, andamos mais devagar ou nem chegamos a andar. Neste sentido, em particular, é necessária uma gestão muito meticulosa do inventário. Muitas vezes enchia a mochila de um item qualquer que sabia vir a precisar no futuro em elevada quantidade (por exemplo, madeira), mas acabava por ter de deixar metade para trás, porque se a carregasse toda comigo andaria muito lentamente, ou, em casos extremos, nem me conseguiria mexer até remover itens suficiente do meu inventário.
Pessoalmente, apreciei estes sistemas, mas admito que não são para toda a gente e que alguns jogadores certamente considerarão que cuidar constantemente de todos estes atributos através de repetidas ações é algo que se pode tornar rapidamente aborrecido.
Para sobreviver no mundo de ARK não nos podemos deixar ficar pelo básico da sobrevivência. A mãe-natureza é implacável para com o Homem, e é recomendada e requerida da nossa parte uma boa preparação. O menu de crafting existe para isso mesmo. Construindo novos itens, matando animais, e coletando plantas, ganhamos XP para poder subir de nível. Subindo de nível, é possível utilizar pontos para melhorar atributos como a sede ou a fome, para que destas não padeçamos assim tão frequentemente, e é também possível utilizar engrams que ganhamos sempre que subimos de nível para desbloquear a construção de novos itens. Esta foi definitivamente a minha parte favorita da jogabilidade em ARK. Encontrava-me frequentemente excitado pelo próximo upgrade, querendo sempre saber que novas possibilidades é que o próximo item me abriria, e procurando freneticamente os materiais necessários à sua construção, após o ter desbloqueado, para ver o que fazia. Não existindo propriamente uma “campanha” neste jogo, senti que era isto que servia de minha principal motivação, e que me propelia a continuar.
Os dinossauros em ARK não eram apenas meus inimigos, sendo a maior parte deles potencialmente amigável e, com tempo e esforço, domesticável. Não é permitida uma jogabilidade 100% vegan, o que desapontará alguns leitores, porque matar os dinossauros pela sua carne e pele, principalmente no início do jogo, revelava-se de uma enorme utilidade, mas domesticá-los também, sendo oferecida uma maior mobilidade num jogo em que senti que o personagem não é tão responsivo quanto eu gostaria. Em ARK, assim, ser defensor dos direitos dos animais também compensa.
MULTIJOGADOR
Para efeitos desta análise não tive a possibilidade de jogar ARK com amigos. Para muitos essa será uma possibilidade apelativa. O jogo oferece possibilidade de co-op, com amigos em servidor privado, ou desconhecidos num servidor público. Os servidores que frequentei estavam geralmente bem populados, e o jogo ordena automaticamente os servidores por ping crescente, estando os servidores com o melhor ping normalmente em primeiro lugar. O jogo também coloca automaticamente como favoritos os servidores já frequentados, para ser mais fácil de encontrar aqueles onde deixei algum progresso guardado. Nunca encontrei quaisquer problemas de ligação aos servidores, desconexões aleatórias ou latência em demasia.
É possível comunicar no servidor através de um chat escrito, não existindo chat por voz, o que é uma pena, porque permitiria comunicar muito mais eficientemente. Não tenho nada contra comunicar por escrito, no PC, mas numa consola, onde o método de escrita é um comando, não dá realmente jeito nenhum, sendo o chat por voz a solução preferível numa situação como esta. Ao jogar com amigos, então, a ausência dessa funcionalidade torna-se ainda mais evidente.
A comunidade pareceu entusiasta, ainda que, tal como eu, desapontada com os gráficos do jogo. Pareceu-me também amigável, tendo eu por várias vezes perguntado dúvidas sobre algumas mecânicas do jogo, ou então sobre os controlos, e de todas as vezes facilmente recebi uma resposta a ajudar.
No modo multijogador é possível criar ou juntar-se a uma tribo, o que ajuda a dar a um jogo situado num mundo tão desolado um certo sentido de comunidade e entreajuda. Recursos são partilhados entre membros da tribo, e os animais domesticados por um são animais domésticos de todos. Aqui, vale o um por todos, e todos por um.
Jogar ARK sozinho pode ser bastante divertido, e tenho de confessar que foi onde passei a maior parte do tempo, até porque a Switch me permitiu jogar em sítios onde não possuía ligação à Internet, como por exemplo no comboio. Contundo, não deixei de sentir que a “promessa de ARK” é bem mais cumprida no modo multijogador. O mundo é desolado, aterrador e perigoso, mas com uma comunidade para ajudar, de repente torna-se bem mais simpático. É também neste modo que as mecânicas emergentes destes jogos de “cria a tua própria aventura” mais têm espaço para florir. Crescem as oportunidades para momentos engraçados, assustadores, e certamente divertidos, quando se juntam outros humanos de comportamento aleatório e imprevisível à mistura.
Notei apenas, contudo, um problema que me frustrou ligeiramente. Chego a um servidor público, nos seus primeiros dias, em que toda a gente, eu incluído, está a um nível muito baixo (nível 1, 2), mas os dinossauros que nos rodeiam são de níveis incrivelmente altos, existindo raptors de nível 50 extremamente ofensivos, e piranhas de nível 150 que me faziam tremer de medo sempre que tinha de ir buscar água ao rio. Isto acontecia na zona que o jogo considera como “fácil”, supostamente. É certo que estou num servidor público onde é suposto agrupar-me com outros jogadores para lutarmos contra ameaças comuns, mas mesmo tendo em conta esta lógica de a união fazer a força, e de o todo ser maior do que a soma das partes, não deixei de ficar com a impressão de que esta é uma experiência fundamentalmente desequilibrada, e extremamente hostil para com jogadores novos e inexperientes. Depois de passar algum tempo num servidor público, perdi a conta ao número de vezes em que morri instantaneamente nas mãos de um dinossauro extremamente acima do meu nível, o que não me parece, de todo, um desafio justo. Felizmente, nenhum destes problemas permeia para o modo de um jogador, estando os níveis dos dinossauros perfeitamente ajustados aos níveis do jogador, criando uma experiência equilibrada e, acima de tudo, justa e recompensadora.
ÁUDIO/MÚSICA
O design de áudio pareceu-me normal. Não é marcante, certamente, servindo bem o seu propósito. Teria, contudo, preferido se a música ambiente estivesse mais presente, porque a banda sonora deste jogo é simplesmente soberba. Sem exageros, considero-a uma das melhores bandas sonoras de videojogos que alguma vez ouvi, tanto que sinto a necessidade de deixar o link do Spotify para a mesma, porque, mesmo que não planeiem comprar o jogo, merece ser ouvida. O tema principal é simplesmente arrebatador. É o tema que está presente no menu principal, o que torna o carregamento deste jogo uma experiência mais agradável.
CONTROLOS
Os controlos são, quase na sua maioria, bons o suficiente, tendo eu apenas apontado previamente que não senti que o personagem fosse responsivo o suficiente. Gostaria que respondesse mais rapidamente aos meus comandos, ou que se virasse mais instantaneamente, por exemplo.
Os controlos dos menus são muito pouco intuitivos. Nota-se, mais do que nunca, que é um jogo desenhado originalmente para PC, porque os menus não são nada fáceis de navegar com o comando, e alguns dos atalhos não são nada intuitivos. Demorei um bocado a habituar-me ao esquema de controlos no que aos menus diz respeito. A partir daí tornou-se numa questão de hábito, mas não vou negar que passei uma boa parte da minha primeira meia hora no jogo a tentar lutar contra os controlos e a tentar perceber o que é que cada botão fazia, porque tal não parecia estar explicado para todos os botões.
VEREDITO
ARK: Surival Evolved é um port para a Nintendo Switch que ninguém consegue realmente compreender bem porque é que aconteceu. Após jogar e ter a oportunidade de o experienciar em primeira mão, fiquei ainda mais na dúvida. Não consigo compreender porque é que este jogo foi trazido para a plataforma, se sacrifícios tão impactantes da experiência central do jogo tiveram de ser feitos. O jogo é jogável, mas visualmente muito pobre, o que é pena, porque a base da jogabilidade é divertida, embora se possa tornar repetitiva.
O Studio Wildcard podia, mas não devia ter trazido este jogo para a Nintendo Switch desta forma tão incompleta. ARK: Survival Evolved é um jogo que à partida não impressiona, dado o seu aspeto gráfico e ausência de história ou objetivo, o que pode afastar muito jogadores na sua primeira experiência. No entanto, apesar de todos os problemas que o jogo apresenta, se nos propusermos a conhecer um pouco mais do seu universo, acabamos por encontrar razões para jogar e até alguns momentos de diversão. Infelizmente, no seu estado atual, ARK é um jogo pobre que me deixou a impressão de um enorme potencial desaproveitado.
Esta análise foi baseada na versão do jogo para a Nintendo Switch. Uma cópia foi gentilmente cedida pela Ecoplay.